ACESSO À JUSTIÇA, TUTELA JURISDICIONAL DOS MENORES TRANSEXUAIS E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA


1RAYNAN HENRIQUE SILVA TRENTIM, 2TEREZA RODRIGUES VIEIRA


1Acadêmico do curso de Direito e bolsista do PEBIC/CNPQ
1Docente do Mestrado em Direito da UNIPAR

Introdução: A ocorrência da transexualidade na infância já é cientificamente comprovada, mas ainda se tem muita dificuldade ao abordar a autonomia, a autodeterminação do menor trans e a efetivação de seus direitos, em decorrência do julgamento recente do Supremo Tribunal Federal autorizando pessoas trans mudarem o prenome e o gênero administrativamente. O advento do Provimento 73 do Conselho Nacional de Justiça, de 28 de junho de 2018, regulamentou e autorizou expressamente apenas os maiores de dezoito anos a recorrerem diretamente ao Cartório para referida mudança.
Objetivo: relatar a ocorrência da transexualidade na pessoa menor de dezoito anos e analisar seu direito à adequação de nome e gênero administrativamente, direto no Cartório.
Desenvolvimento: Em nome do princípio da igualdade, é necessário criar mecanismos que assegure direitos a quem a lei ignora (DIAS, 2013, p. 69), com base no princípio da igualdade e não discriminação. Em 1º de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) votou a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 4.275 e RE 670.422, que foi impetrada pela Procuradoria Geral da República, pleiteando a inconstitucionalidade da obrigatoriedade de cirurgia transgenital para o reconhecimento da mudança de prenome e de gênero no registro civil. A Corte, em votação do mérito da questão, decidiu a favor da não obrigatoriedade das cirurgias para a adequação dos documentos e autorizou a mudança de forma administrativa, diretamente no cartório, sem necessidade de pareceres médicos ou psicológicos, não fixando na decisão idade mínima para a adequação de nome e gênero feita diretamente no cartório. O ministro Celso de Melo argumentou que o direito à autodeterminação sexual justifica a legitimidade à adequação da identidade no Registro Civil, pois o Estado não pode limitar, restringir, excluir, obstar ou embaraçar o exercício, por qualquer pessoa, de seu direitos à identidade de gênero, por tratar-se de um direito da personalidade. O Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDfam), elaborou uma minuta e encaminhou ao Conselho Nacional de Justiça com uma proposta de regulamentação da decisão do STF, onde recomendou a autorização para a mudança administrativa somente a maiores de 12 anos. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamentou a decisão com o provimento 73, de 28 de junho de 2018, onde restringiu a decisão dos ministros, autorizando apenas os maiores de 18 anos, capazes, a mudarem o nome e o gênero diretamente no cartório de forma administrativa, nada mencionando acerca dos menores ou emancipados. Sucede que, a transexualidade pode ocorrer em menores de 18 anos e esses ainda terão que ingressar na justiça para ter efetivado o seu direito à identidade de acordo com o gênero. Para tanto, a criança e o adolescente terão assegurados essa mudança em todos os seus documentos, inclusive na documentação escolar e no consequente uso do banheiro e prática desportiva de conformidade com seu gênero, cessando ou diminuindo a discriminação a qual eram compelidos a se submeter diariamente. Ao menor deve ser igualmente garantido, o acompanhamento ambulatorial, onde serão avaliadas suas necessidades. Em havendo recusa dos pais, com base no Estatuto da Criança e do Adolescente o Ministério Público deverá buscar a tutela jurisdicional para garantir o devido acesso à justiça e ao acompanhamento psicológico e o bloqueio hormonal, se for o caso, com base no melhor interesse do menor.
Conclusão: Conclui-se que, em nome do princípio da dignidade da pessoa humana e da veracidade registrária, a pessoa transexual tem o direito à adequação de seu registro na forma extrajudicial, assim como determinou o Superior Tribunal Federal, não podendo o Conselho Nacional de Justiça regulamentar restritivamente o reconhecimento das pessoas transgênero, pois deve prevalecer o princípio bioético da autonomia com a autodeclaração.

Referências
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União. Seção 1, p. 13563, 13 Jul. 1990.
BRASIL. Provimento n.73, de 28 de junho de 2018. Dispõe sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de pessoa transgenero no registro civil das pessoas naturais (RCPN). Disponível em: < https://www.conjur.com.br/dl/cnj-regulamenta-alteracoes-nome-sexo.pdf>. Acesso em 15 ago. 2018.
DIAS, M. B. Manual de direito das famílias. ed. 9. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 69.
IBDFAM. Pedido de Providências nº 0005184-05.2016.2.00.0000. Manifestação sobre a proposta de normatização para transgêneros promoverem a mudança do nome e da identidade de sexo, em face da decisão do STF na ADI 4.275. Belo Horizonte, MG, 16 abr. 2018.
MELO, C. Ação direta de inconstitucionalidade 4.275 Distrito Federal: Voto. Supremo Tribunal Federal, Brasília, DF, 2018. Disponível em: > Acesso em 03 maio 2018.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. STF reconhece a transgêneros possibilidade de alteração de registro civil sem mudança de sexo. Notícias do STF. 2018. Disponível em: . Acesso em 07 maio 2018.